O avanço do diabetes tipo 2 em escala global não pode ser dissociado da transição alimentar vivida nas últimas décadas. A crescente presença de alimentos ultraprocessados (AUPs) na dieta da população está diretamente ligada a mecanismos centrais da fisiopatologia do diabetes, como a resistência insulínica, o estado inflamatório crônico e o acúmulo de gordura visceral.
Embora práticos e de fácil acesso, os AUPs são formulações industriais com baixo valor nutricional e alto teor de calorias, açúcares, gorduras saturadas e aditivos químicos. Sua ingestão habitual altera profundamente a resposta metabólica do organismo, favorecendo o ganho de peso e a disfunção hormonal, pilares que sustentam o desenvolvimento do diabetes tipo 2.
Por isso, compreender de que maneira os alimentos ultraprocessados contribuem para o adoecimento metabólico é importante para promover escolhas alimentares mais conscientes e sustentáveis. Continue a leitura e aprofunde-se nesse tema!
Como os ultraprocessados contribuem para o diabetes tipo 2
Estudos de coorte e revisões sistemáticas recentes têm demonstrado que o consumo elevado de AUPs está associado a maior risco de desenvolver diabetes tipo 2, mesmo em indivíduos com dieta equilibrada ou peso corporal adequado. Essa associação não se limita à qualidade nutricional dos produtos, mas envolve múltiplos mecanismos fisiopatológicos.
Dietas ricas em ultraprocessados levam ao aumento da ingestão calórica total, à hiperinsulinemia persistente e à deposição de gordura ectópica, especialmente em órgãos como fígado e pâncreas. Esse excesso energético promove resistência insulínica, que é uma condição em que os tecidos deixam de responder adequadamente à insulina, exigindo sua produção em níveis cada vez maiores.
Além disso, compostos comumente encontrados nesses alimentos, como emulsificantes, adoçantes artificiais e contaminantes formados no processamento (como a acrilamida e o bisfenol-A), alteram a microbiota intestinal e aumentam a permeabilidade da mucosa. Esse desequilíbrio desencadeia processos inflamatórios sistêmicos que agravam ainda mais a disfunção metabólica.
Risco aumenta mesmo com pequenos incrementos na dieta
A cada incremento de 10% na proporção de ultraprocessados na dieta está associado a um aumento de até 15% no risco de diabetes tipo 2. Essa relação se mantém mesmo após ajustes para fatores como atividade física, índice de massa corporal e qualidade da alimentação.
Em populações já vulneráveis, como mulheres com histórico de diabetes gestacional, o consumo habitual de AUPs se correlaciona com maior incidência de diabetes, independentemente do peso ou de outros parâmetros metabólicos. Isso destaca o papel direto e multifatorial desses produtos no desenvolvimento da doença.
Perfil do consumidor: quem mais consome ultraprocessados?
O padrão de consumo de ultraprocessados não é homogêneo entre as populações. Estudos internacionais e nacionais mostram que jovens, moradores de áreas urbanas e pessoas com maior renda ou escolaridade tendem a consumir mais desses produtos. Já em países desenvolvidos, o padrão se inverte, com maior consumo em grupos de menor renda e escolaridade.
Entre crianças e adolescentes, o cenário é ainda mais alarmante. Faixas etárias entre 6 e 19 anos apresentam as maiores proporções de ingestão calórica proveniente de AUPs. Esse padrão alimentar na infância pode antecipar alterações metabólicas e aumentar significativamente o risco de doenças crônicas na vida adulta.
Mulheres, indivíduos não empregados, fumantes, sedentários e pessoas com baixa escolaridade também apresentam maior associação entre consumo elevado de ultraprocessados e pior qualidade de vida física, sugerindo um efeito cumulativo entre hábitos de vida e vulnerabilidades sociais.
Além das disparidades econômicas, esses dados revelam a urgência de políticas públicas específicas voltadas para educação alimentar, especialmente entre jovens e grupos socialmente vulneráveis.
A prevenção começa com escolhas alimentares conscientes
A prevenção do diabetes tipo 2 demanda uma abordagem integrada, mas a alimentação permanece como o ponto de partida mais eficaz e acessível. Reduzir o consumo de ultraprocessados e priorizar alimentos in natura ou minimamente processados são medidas importantes para reequilibrar o metabolismo e conter o processo inflamatório crônico que antecede a doença.
Nesse contexto, profissionais de saúde, especialmente nutricionistas, desempenham um papel estratégico tanto na orientação individualizada quanto na promoção de hábitos alimentares mais conscientes em nível populacional. Práticas como a leitura crítica de rótulos, o planejamento das refeições e a escolha de substituições saudáveis são ferramentas que fortalecem a autonomia do paciente e favorecem a prevenção em longo prazo.
Vale lembrar que, embora a alimentação seja um dos pilares do controle glicêmico, ela não atua isoladamente. O uso adequado da insulina, incluindo seu armazenamento correto, é igualmente decisivo para a eficácia do tratamento.
Sabendo disso, te convidamos a aprofundar seu conhecimento com o nosso Guia para armazenamento e uso correto da insulina no diabetes disponível no Blog da Labor Health Supply!
Referências:
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